Imagem http://bigslam.pt por Reda�o RBA Morreu hoje (5), aos 95 anos, o ex-presidente da frica do Sul Nelson Mandela, smbolo mximo da luta contra o apartheid, o regime de segrega�o racial. “Ele partiu, se foi pacificamente na companhia de sua famlia. Nossa na�o perdeu seu maior filho. Nosso povo perdeu seu pai”, disse o presidente Jacob Zuma. “Ele se sacrificou muito para que o nosso povo pudesse ser livre.” Mandela morreu em casa, para onde havia sido levado em 1 de setembro, aps trs meses de interna�o, para tratamento de uma infec�o hospitalar. Responsvel pelo fim do apartheid, Mandela conquistou o respeito de adversrios e crticos devido aos esforos em busca da paz. Ele foi o primeiro presidente negro da frica do Sul, de 1994 a 1999, e recebeu o Prmio Nobel da Paz, em 1993. Madiba, o reconciliador, recebeu o ttulo de O Pai da Ptria. A Organiza�o das Naes Unidas (ONU) instituiu o Dia Internacional Nelson Mandela em defesa da luta pela liberdade, justia e democracia. De uma famlia sul-africana nobre, do povo thembu, Mandela ficou 27 anos preso em decorrncia de sua luta em favor da igualdade racial, da liberdade e da democracia. Na pris�o, escreveu sua autobiografia. Preparado pela famlia para ocupar um cargo de chefia tribal, Mandela n�o aceitou o posto e partiu em dire�o a Joanesburgo para cursar direito e fazer poltica. Com amigos, Mandela criou a Liga Juvenil do Congresso Nacional Africano (CNA), cuja sigla em ingls Ancyl. Ele foi eleito secretrio nacional da Ancyl e executivo nacional do CNA. O princpio da sua poltica a paz. Na pris�o, Mandela n�o tinha contato com o exterior, pois n�o podia receber jornais e notcias externas. Mesmo no perodo em que esteve preso, Mandela recebeu homenagens. No dia em que deixou a pris�o foi recebido por uma multid�o. Ele gritava: ?Poder? e os manifestantes respondiam: ?Para o Povo?. A elei�o de Mandela foi um marco na histria do pas, definindo a nova frica do Sul com um processo de reconcilia�o entre oprimidos e opressores. Em 1992, o resultado do referendo entre os brancos d ao governo, com mais de 68% de votos, o aval para as reformas e permite uma futura constituinte. Em 2001, Mandela foi diagnosticado com cncer de prstata, mas apesar do tratamento ele fez campanha em favor do combate aids, um dos principais problemas de sade pblica na frica do Sul. Ao completar 85 anos, ele anunciou a aposentadoria. Exemplo de amor e resistncia Para o cientista poltico Paulo Baa, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Mandela um exemplo n�o s de resistncia, mas de amor. ?Nelson Mandela, nas pocas duras, difceis e sombrias do apartheid, com a brutal discrimina�o e a violncia contra os negros e os pobres na frica do Sul, se tornou um smbolo e um intelectual da resistncia. Ele, preso, liderou a movimenta�o poltica das vrias etnias da frica do Sul contra o regime do apartheid e conseguiu, de dentro da cadeia, ser um chefe de estado e estabelecer conexes com todo o mundo?, disse. Segundo Baa, as conexes feitas por Mandela levaram a Organiza�o das Naes Unidas a impor sanes econmicas frica do Sul e motivaram presses para a independncia do pas. ?Mandela foi um pacifista, ao mesmo tempo um lutador, na mesma linhagem de Gandhi, s que de matriz africana. Mandela foi um grande sbio. Ele soube trabalhar com a resistncia e, ao mesmo tempo, sabia negociar. Ele trabalhava com a ideia de solidariedade e de amor, como perspectiva de constru�o de uma na�o. E foi plenamente vitorioso, e seus inimigos plenamente derrotados?, disse Baa. O cientista poltico destacou que, embora tenha derrotado os inimigos, Mandela os acolheu, numa demonstra�o da grandeza de seu carter. Por isso, deixou para a humanidade o legado de que a intolerncia pode ser combatida e a harmonia estabelecida em qualquer parte do mundo, ?desde que haja generosidade, amor e firmeza de afeto, de acolhimento, sem submiss�o?, ressaltou o especialista. Trajetria “Durante a minha vida, dediquei-me a essa luta do povo africano. Lutei contra a domina�o branca, lutei contra a domina�o negra. Acalentei o ideal de uma sociedade livre e democrtica na qual as pessoas vivam juntas em harmonia e com oportunidades iguais. um ideal para o qual espero viver e realizar. Mas, se for preciso, um ideal pelo qual estou disposto a morrer”. As palavras acima foram ditas em 1964, durante seu julgamento. Em junho daquele ano, ele seria condenado pris�o perptua. Enviado para a pris�o da Ilha Robben, Mandela passou a ocupar a cela de nmero 466/64, cujas dimenses eram de 2,5 por 2,1 metros, e uma pequena janela de 30 cm. Viveu ali por 27 anos. O prolongado perodo de crcere ao qual Mandela foi submetido era uma manifesta�o direta do brutal regime segregacionista do apartheid imposto pelos sucessivos governos do Partido Nacional na frica do Sul. De 1948 a 1994, ano das primeiras eleies livres no pas ?” conquistadas pelo lder popular ?”, os direitos da grande maioria dos habitantes eram cerceados pelo governo, formado pela minoria branca. De fato, a segrega�o racial data do perodo colonial, mas o apartheid foi introduzido como poltica oficial no final dos anos 1940. Com ele tiveram origem os bantustes, pseudoestados de base tribal criados pelo regime para manter os negros fora dos bairros e terras brancas, mas suficientemente perto delas para servirem de fontes de m�o-de-obra barata. Pouco tempo antes, o jovem Mandela, membro de uma famlia de nobreza tribal da etnia Xhosa, nascido em uma pequena aldeia do interior, se mudou para capital, Johannesburgo, com 23 anos e comeou a atuar na poltica. Naquele ambiente cosmopolita, em contraste com o cenrio rural no qual havia vivido at ent�o, Mandela se formou em advocacia e passou a liderar a resistncia n�o-violenta da Liga da Juventude do CNA (Congresso Nacional Africano). Na Fort Hare, primeira universidade da frica do Sul a ministrar cursos para negros, Mandela fez muitos amigos com quem mais tarde formaria o ncleo de comando da Liga, movimento de resistncia ao apartheid que se transformou em partido poltico a partir de 1994, o CNA. Na capital, Mandela trabalhou como vigia de uma mina e conheceu Walter Sisulu, ativista poltico, em 1941. Sobre o encontro Sisulu diria, mais tarde: “Queramos ser um movimento de massa, e ent�o um dia um lder de massa entrou no meu escritrio.” Alguns anos depois, Mandela se juntou a outro ativista, Oliver Tambo, com quem inaugurou o primeiro escritrio advocatcio negro do pas. Biografias de Mandela analisam que, somente em Johannesburgo, quando j n�o era mais tratado como um garoto da nobreza tribal, e sim como mais um negro pobre do interior, o jovem percebeu a dimens�o do abismo entre brancos e negros. Essa, provavelmente, foi a fagulha determinante para o incio da luta contra o racismo. Em 1951, Mandela eleito presidente da Liga e no ano seguinte presidente do CNA na provncia de Transvaal, o que o coloca como vice-presidente nacional da institui�o. Em 26 de junho do ano seguinte, lanada na frica do Sul a ?Campanha de Desafio?: por todo o pas, negros s�o convidados a usarem os espaos reservados aos brancos ?” banheiros, escritrios pblicos, correios. Ele condenado, junto a outros 19 companheiros, com base na Lei de Repress�o ao Comunismo, a uma pena de nove meses de trabalhos forados. Em 8 de abril de 1960, o CNA banido e Mandela fica preso at o ano seguinte, quando passa para a clandestinidade. Em 1961, ele cria o Umkhonto we Sizwe ?” “Lana de uma Na�o” ?” tambm conhecido pela sigla “MK?, brao armado do CNA. O movimento surge em resposta ao Massacre de Sharpville, em 20 de maro de 1960, quando 69 negros foram metralhados pelas foras de segurana em um protesto do PAC (Congresso Pan-Africano) contra a Lei do Passe, que obrigava os negros da frica do Sul a usarem uma caderneta na qual estava escrito aonde eles poderiam ir. Segundo Mandela, o treinamento militar seria paralelo ao poltico, de forma a ficar bem definido que a revolu�o serviria para tomar o poder, e n�o para habilitar atiradores. “Ns adotamos a atitude de n�o violncia s at o ponto em que as condies o permitiram. Quando as condies foram contrrias, abandonamos imediatamente a n�o violncia e usamos os mtodos ditados pelas condies?, explicou na ocasi�o. Em 1962, Mandela vai a Londres, onde adquire livros sobre guerra e guerrilha. Ele e Tambo se renem com vrios polticos e, dali, percorrem diversos pases africanos em busca de apoio contra o Apartheid. As ideias de Mandela passavam pela constru�o de um exrcito revolucionrio, capaz de conquistar o apoio popular, instalar escolas de doutrina�o, coordena�o adequada da guerrilha, oportunidades psicolgicas das aes etc. Ele retorna ao pas de seu priplo internacional aps alguns meses, especialmente para relatar aos lderes do CNA e do MK sobre seu aprendizado. Estava com Walter Sisulu quando foram detidos, em 5 de agosto de 1962. Pris�o Mesmo aps ser detido e sentenciado, Mandela julgado novamente, por acusaes ainda mais graves, relacionadas s atividades no exterior. Uma delas era ?atuar para promover os objetivos do comunismo?. No julgamento de Rivonia, ele e outros nove lderes sul-africanos s�o condenados pris�o perptua. No decorrer dos 27 anos que ficou preso, Mandela se tornou de tal modo associado oposi�o ao apartheid que o clamor “Libertem Nelson Mandela” se tornou o lema das campanhas antiapartheid em vrios pases. Durante os anos 1970, ele recusou uma revis�o da pena e, em 1985, n�o aceitou a liberdade condicional em troca de n�o incentivar a luta armada. Mandela continuou na pris�o at fevereiro de 1990, quando a campanha do CNA e a press�o internacional fizeram com que ele fosse libertado em 11 de fevereiro, aos 72 anos, por ordem do presidente Frederik Willem de Klerk. Centenas de apoiadores o aclamaram na sada, respondendo em jbilo quando ele ergueu o punho fechado no ar, em sinal de vitria. Chegava ao fim o longo crcere, de mais de 20 anos. A partir dali a histria da frica do Sul seria outra. “Quando me vi no meio da multid�o, alcei o punho direito e estalou um clamor. N�o havia podido fazer isso faz 27 anos, e me invadiu uma sensa�o de alegria e de fora?, disse na poca. Ele e de Klerk dividiram o Prmio Nobel da Paz em 1993. Como presidente do CNA (de julho de 1991 a dezembro de 1997) e primeiro presidente negro da frica do Sul (de maio de 1994 a junho de 1999), Mandela comandou a transi�o de um regime de minoria no comando, para a democracia multirracial da moderna frica do Sul. Para simbolizar os novos tempos adota um novo hino nacional, que mescla o hino do CNA (Nkosi Sikolele Africa – Deus bendiga a frica) com o africner (Die Stein); tambm uma nova bandeira criada, unindo os smbolos das duas instituies anteriores: a bandeira oficial dos brancos, em vigor desde 1928 passou a incorporar as cores da bandeira do CNA – plasmando assim a uni�o de todos os povos da nova na�o que surgia – aprovados pela nova Constitui�o interina. Em julho de 1995, Mandela cria a Comiss�o da Verdade e Reconcilia�o sem poderes judicantes, sob presidncia do arcebispo Tutu. Tem incio um processo doloroso, principalmente para os sul-africanos negros, aps dcadas de segrega�o e violncia. Quase 20 anos depois, muitas feridas ainda permanecem abertas, alimentadas pela todavia dificultosa integra�o entre negros e brancos. Apesar da democratiza�o, o racismo e o preconceito sobrevivem na frica do Sul. Mandela n�o viu em vida seu ideal se concretizar em plenitude, mas foi o fundamental e principal responsvel pelo despertar de um povo e a posterior constru�o de uma na�o. “Amandla!” (“Poder!”), gritava Mandiba em Xhosa aos seus seguidores, que respondiam “Awethu!” (“Para o povo!”). Morre um revolucionrio. Com informaes da Agncia Brasil e do Opera Mundi