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O Golpe da terceirização foi contra os trabalhadores

O Brasil viveu no dia de ontem (22/03) um retrocesso de mais de 70 anos nos seus direitos sociais e trabalhistas: sem o mínimo de debate com a sociedade, a Câmara dos Deputados, sob as ordens expressas do Palácio do Planalto, desengavetou um Projeto de Lei que parecia estar morto, mas não estava.

Desde o ano de 1998, quando foi apresentado pelo Poder Executivo (à época, o governo FHC), o PL 4.302/1998 teve no âmbito do Congresso Nacional, para dizer o mínimo, uma tramitação errante: nos anos de governo neoliberal (1998/2002) a sua movimentação nas comissões da Câmara se deu muito fortemente. A partir de 2003, este PL teve uma tramitação lenta, quase moribunda, esforçando-se para passar-se despercebido. Somente no ano de 2016, o país já sob o golpe parlamentar, este PL da terceirização volta com força a se movimentar nas comissões do Congresso Nacional.

Com todo apoio e força do governo sem votos e mentiroso, a Câmara dos Deputados sob a presidência do golpista Rodrigo Maia, mera correia de transmissão dos interesses desse governo ilegítimo de Temer, impôs ao Brasil aquilo que nem os governos militares e tampouco os governos de matiz neoliberal tiveram coragem de fazer: enterrar a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, uma das maiores redes de proteção social que o país construiu durante os últimos 70 anos.

O PL aprovado no dia de ontem acaba na prática com a CLT porque permite que toda a atividade econômica do país, seja no meio urbano ou rural, no setor privado ou público, seja terceirizada. O impacto nos diferentes setores da economia se dará de forma diversa, a depender das características de cada atividade econômica e das possibilidades que essa alteração legislativa permite. O esforço aqui será o de demonstrar que, ao fim e ao cabo, as alterações aprovadas institucionalizam o “bico” no Brasil, além de evidenciar os impactos nefastos em cada setor de atividade econômica, inclusive no âmbito da educação pública brasileira.

·Permissão da terceirização ampla e irrestrita – se antes a terceirização era permitida somente nas atividades-meio das empresas, como os serviços de limpeza, vigilância e recepção, por exemplo, agora ela é permitida até para as suas atividades-fim. No limite, isso cria um cenário de que uma empresa no Brasil não precisa ter funcionários contratados diretamente já que todos podem, potencialmente, ser subcontratados.

          Isso permitirá às empresas uma redução média de 30% no custo de sua força de trabalho. Essa margem servirá para pagar o lucro do intermediário no processo de terceirização e aumentar as margens de lucro do empresário contratante, comprometendo o aumento real de salário que ocorreu na última década no Brasil.

·Terceirização no serviço público – somente as carreiras típicas de Estado, como juízes, procuradores, promotores, auditores fiscais e policiais, serão poupadas da terceirização, o que obrigará o Estado ainda a contratar diretamente servidores públicos para essas funções. A grande massa de trabalhadores do setor público, especialmente aquela vinculada ao setor da saúde e educação públicas, poderá ser terceirizada. Reparem que, no caso da educação, essa mudança chega junto com a entrada das Organizações Sociais no setor e, também, junto com a Reforma do Ensino Médio, que prevê a contratação de professores “horistas”, sem concurso público, por notório saber.

          No caso do setor público, será generalizada uma prática que já se vê em alguns lugares e outros setores: as Organizações Sociais serão a referência para a prestação dos serviços de saúde e educação, que passarão a contratar de forma terceirizada para reduzir drasticamente os custos com folha de pagamento de pessoal dos governos. E a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) estimulará ainda mais a terceirização, pois o pagamento às empresas terceirizadas, encarregadas pela contratação de pessoal, não incide no cômputo dos limites prudenciais.

·Ampliação do prazo para contratos temporários – se hoje a legislação impõe um limite de 90 dias para a contratação temporária, esse limite passa agora a ser de 180 dias (6 meses), podendo prorrogar-se de forma indefinida se não houver qualquer vedação no Acordo ou na Convenção Coletiva de Trabalho da categoria.

          Isso permitirá que, nos setores mais desorganizados e fragilizados sindicalmente, o contrato temporário seja a regra mais comum de contratação de pessoal – trabalhadores eternamente temporários justamente porque não temos uma organização sindical forte em vários setores de nossa economia.

          No entanto, até setores organizados, como a educação, sofrerão as consequências da ampliação dos contratos temporários, visto que o PL 4302 acaba regulamentando o artigo 37, inciso IX, da Constituição Federal, que trata da contratação temporária em caráter excepcional no serviço público. Ou seja, a regra do concurso público (art. 37, inciso II da CF) praticamente é extinta com essa flexibilização. Trocando em miúdos: o concurso público tornar-se-á facultativo ao gestor público.

·Negociação dos contratos temporários – ao tratar sobre a vigência desse contrato, como exposto acima, o PL permite que, se o Acordo ou Convenção Coletiva não impuser qualquer restrição, o contrato temporário poderá ser prorrogado ad aeternum. Na prática, isso significa que o negociado no Acordo ou na Convenção Coletiva de uma categoria possa, nesse aspecto, sobrepor-se ao preconizado na lei. Esse é o ponta pé inicial para regulamentação do negociado sobre o legislado no âmbito da Reforma Trabalhista.

·Fim da responsabilidade solidária das empresas contratantes – a nova proposta desresponsabiliza, em grande medida, a empresa contratante das obrigações trabalhistas com aqueles empregados terceirizados. A responsabilidade agora é subsidiária já que os bens da empresa contratante somente poderão ser penhorados pela Justiça se não houver mais bens da fornecedora de terceirizados para o pagamento da condenação relativa a direitos não pagos.

·Rebaixamento das condições de trabalho – com a aprovação deste PL, a empresa contratante não é obrigada a oferecer as mesmas condições de trabalho dos contratados diretos pela empresa aos terceirizados, como atendimento médico e ambulatorial e acesso ao refeitório da empresa.

·Quarteirização – a partir de agora, será permitido à empresa terceirizada subcontratar outras empresas para realizarem alguns serviços nas dependências da contratante. Ou seja, a empresa que fornece a mão de obra terceirizada poderá, ela também, recorrer a outra empresa de mão de obra terceirizada para prestar serviço na empresa por ela contratada originalmente. É uma espécie de sublocação da mão de obra, também chamada de quarteirização.

·Pejotização – O projeto amplia as possibilidades de contratação de pessoas físicas na forma de pessoa jurídica (pejotização), o que na prática implica na perda de direitos do trabalhador, a exemplo de férias, 13º salário, Fundo de Garantia, aviso prévio, etc.

·Greve – o PL aprovado permite a contratação de trabalhadores temporários para substituir trabalhadores em greve, abrindo um precedente perigoso para ferir de morte o direito de greve assegurado em nossa Constituição, mas que nunca foi regulamentado para o setor público.

Por fim, cumpre destacar que, como já detectado em várias pesquisas, a experiência das terceirizações nas atividades-meio já gera um incremento significativo tanto no número de acidentes de trabalho, por vezes até ceifando a própria vida de milhares de trabalhadores, quanto na taxa de rotatividade no próprio mercado de trabalho, o que gera insegurança e, em decorrência disso, o aparecimento de inúmeras doenças do trabalho. Não será nenhuma surpresa se começarmos a ver no Brasil sucessivas tragédias humanas por conta dessa votação irresponsável da Câmara, a mando desse governo.

Esses são os aspectos mais centrais desse projeto que integra a Reforma Trabalhista do governo golpista e, como se vê, é uma verdadeira barbárie! Atinge a todos de forma indiscriminada!! Um retrocesso ao início do século passado, quando os direitos sociais e trabalhistas começaram a ser construídos no Brasil e no mundo.

A resposta a essa barbárie não pode ser outra se não a luta incessante e permanente por nossos direitos! Todos à rua! A CNTE e seus sindicatos filiados conclamam a todos para nos unirmos ao chamamento da Central Única dos Trabalhadores – CUT que já está a chamar uma Greve Geral de todo o país para o mês de abril! O pontapé inicial da Greve Geral será em 31 de março, Dia Nacional de Mobilização!! Não ao rebaixamento salarial dos trabalhadores brasileiros! Não à precarização das relações de trabalho!! Derrotaremos esses golpistas nas ruas!!
Brasília, 23 de março de 2017
Diretoria Executiva da CNTE

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